“CLT é referência mundial na defesa dos direitos trabalhista”
O desembargador aposentado da Justiça do Trabalho Márcio Túlio Viana deu início ao segundo dia do Seminário de Pauta do Sindpd falando sobre o tema “70 anos de CLT: uma história de trabalhadores”, que aborda a história e os desafios da Consolidação das Leis de Trabalho (CLT). O advogado afirmou que a CLT é uma das legislações mais modernas do mundo no que diz respeito à defesa e garantia dos direitos trabalhistas.
Segundo Viana, em seus 71 anos de existência, os 922 artigos da Consolidação das Leis de Trabalho sofreram 1.236 alterações. “Muitas pessoas argumentam que a CLT está ultrapassada e engessada, mas isso não é verdade. Os artigos que a compõe foram alterados durante os anos para atender os trabalhadores e servem de referência para inúmeros países. Podemos afirmar que o direito trabalhista favorece os oprimidos”, disse.
O jurista explica que o direito do trabalho é fruto do capital, pois, com o desenvolvimento industrial, as fábricas organizaram os trabalhadores que antes eram dispersos. “É verdade que o direito trabalhista favorece também as empresas porque formaliza os deveres do trabalhador, mas o empregado é o beneficiário direto da CLT”, afirma Viana.
Para Antonio Neto, presidente do Sindpd, até hoje a CLT serviu de base para todos os avanços conquistados, sejam eles constitucionais ou advindos das Convenções Coletivas de Trabalho, uma vez que fortaleceu os sindicatos e garantiu a eles estrutura e independência para enfrentar a força do capital.
De acordo com o desembargador, se não existisse a CLT, os trabalhadores no Brasil seriam como antes da década de 1930, que viviam em condições análogas à escravidão, trabalhando mais de 10 horas por dia. “O proletariado do período se sentia menos gente que a gente”, avalia.
Riscos da flexibilização
A flexibilização dos direitos trabalhistas, que vem sendo colocada em pauta por empresários e por alguns políticos, visa permitir às empresas e aos sindicatos fecharem acordos sobre direitos trabalhistas com regras mais elásticas, como parcelamento das férias de 30 dias, da licença-maternidade e do descanso de uma hora para almoço.
Para Márcio Túlio, a proposta é fazer com que o negociado possa prevalecer sobre o legislado. “Este mecanismo que cria elasticidade na lei é uma forma de retrocesso, considerando que os acordos coletivos já cumprem o papel de acordar maiores benefícios aos trabalhadores. A CLT e as demais leis que compõem o direito trabalhista são um limite; não é necessário abrir brechas para possíveis abusos dos empresários”, explica.
De acordo com o desembargador, há países em que os trabalhadores não têm qualquer proteção trabalhista. As taxas de crescimento deles geralmente são maiores que as do Brasil. No entanto, o custo humanitário desta maior eficiência econômica nunca é levado em conta pelos defensores da extinção da CLT. “A economia do País não deve visar apenas o crescimento da produção de bens de consumo, o aumento da produtividade dos empregados e a maximização dos lucros dos empresários. A finalidade da economia é proporcionar bem-estar às pessoas, inclusive àquelas que desgastam suas vidas operando as máquinas que produzem as coisas que serão comercializadas. CLT é fundamental para o bem-estar social”, afirma.
Segundo Antonio Neto, a CLT libertou os trabalhadores. “Não é exagero afirmar que as leis trabalhistas promoveram a libertação da escravatura, na prática, para muitos brasileiros. Ainda hoje, a Consolidação das Leis do Trabalho representa a segurança do trabalhador e uma carta sagrada para os empresários sérios e modernos, pois nada é mais moderno do que combater a desigualdade”, afirmou.
Para o dirigente, a exploração é inaceitável. “Combater a CLT ou taxá-la de retrógrada só interessa aos maus empresários, que visam ao lucro a qualquer preço, que tentam confundir os direitos trabalhistas com impostos que recaem sobre a folha de salários, criando uma falsa impressão de que o “custo” de um trabalhador impede a competitividade das empresas brasileiras”, enfatizou o presidente do Sindpd.
A crescente terceirização desenfreada nas empresas é apontada como um “ponta pé” inicial dos empresários que buscam a flexibilização da CLT, segundo o desembargador. “O número de trabalhadores terceiros só não é maior porque o Tribunal Superior do Trabalho (TST) tem agido para conter esta onda. Desde o fim da década de 1990, quando começou a crescer esse tipo de contratação, aumentou o número de processos trabalhistas. Atualmente são cerca de 2 milhões por ano, ou seja, as perdas do trabalhador são reais. A terceirização é vantagem apenas para o capitalismo”, afirma Viana. O desembargador apontou como uma possível solução para não flexibilização dos direitos trabalhistas a busca pelo diálogo com os trabalhadores e o aperfeiçoamento da CLT.